De início, importante fazer menção que no âmbito trabalhista, grande parte dos direitos que o empregado venha a possuir, se convertem em dinheiro, assim, não é diferente no tocante ao controle de jornada do empregado, uma vez irregular, este, tem direito sonegado, o qual pode ser compensado com folgas ou com o pagamento correspondente.
Muito embora seja um assunto comum, devido às particularidades inerentes ao tema e as recentes alterações, necessário a atenção, tanto pela parte patronal como pelo obreiro, tendo em vista que foi objeto de alteração da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) e novidade da Lei da Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019).
É dizer, antes da Reforma Trabalhista entrar em vigor, havia a previsão legal do controle de jornada dos empregados, de forma manual, mecânica ou eletrônica somente para empresas que contassem com 10 ou mais empregados. Todavia, a partir da vigência da referida Lei, esta previsão se destinou a empresas que computem 20 ou mais empregados.
No entanto, em que pese a determinação legal do mencionado controle para estabelecimentos que contem com 20 empregados ou mais, não significa que havendo quantidade inferior de empregados não possa adotar o controle, é até benéfico que todos os empregadores, independentemente do número de colaboradores se amparem com o controle de jornada, desde que seja um controle fiel, evitando-se, dessa forma, a sonegação da remuneração do colaborador pelo excesso trabalhado, bem como de o empregador ser responsabilizado na esfera trabalhista e sofrer autuações dos órgãos fiscalizadores.
Para inovar ainda mais, a Lei da Liberdade Econômica trouxe um método diferente de controle de jornada, preteritamente a esta, o único modo de controle era o tradicionalmente conhecido (anotação dos horários de início, intervalo e término da jornada). Atualmente, ainda que pouco utilizado, é possível o controle por exceção, ou seja, anota-se somente os fatos excepcionais, como: atrasos, faltas, horas extras ou afastamentos. Considerando a suscitada inovação, presume-se o leal cumprimento da jornada normal de trabalho, razão pela qual o empregado anotará tão só o que fugir da regularidade.
Não obstante, só é possível a adoção do registro por exceção se houver acordo individual escrito (entre empregado e empregador), convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.
Exaurida a introdução ao tema, questiona-se: o que é controle de jornada? Controle de jornada, como o próprio nome diz, consiste em controlar a jornada do trabalhador, horários de entrada e saída, bem como as pausas de intervalo para refeição e descanso (no caso do controle tradicional) ou, do controle da excepcionalidade (no caso da adoção do registro por exceção). Em ambos os casos, utilizado também, para o pagamento de eventuais horas extras e/ou descontos de atrasos, faltas, etc.
Ainda, para que o conteúdo do cartão de ponto seja válido, é crucial observar o dia a dia do empregado, como exemplo, na hipótese de um colaborador iniciar suas atividades antes do horário contratual e só “bater o ponto” quando der o horário compactuado, este cartão não é fidedigno, pois oculta direito inerente do trabalhador, o direito ao pagamento pelo excesso trabalhado.
Da mesma forma, em havendo anotação britânica de jornada, isto é, marcação de ponto sem variação, este também carece de credibilidade. Como exemplo, o colaborador que tenha seu espelho de ponto com horários uniformes, como: entrada às 08h00, saída às 18h00, de forma frequente, considera-se cartão de ponto britânico, inválido, portanto.
Para explicar esta invalidade é importante fazer referência ao Princípio da Primazia da Realidade, deve-se pensar na realidade do empregado como pessoa. É pouco provável que o trabalhador consiga iniciar/pausar/encerrar suas atividades laborais todos os dias no mesmo horário, por esta razão os Tribunais pacificaram a invalidade do controle britânico.
Em termos gerais, havendo cartão de ponto britânico ou ausência de anotação de horários, em caso de uma reclamação trabalhista, presume-se a veracidade dos horários indicados pelo trabalhador com a consequente condenação do empregador ao pagamento das horas extras realizadas e não remuneradas. Vale ressaltar, por óbvio, deve ser observada a boa-fé, uma vez que o judiciário não consiste em meio para enriquecimento indevido.
Todavia, em que pese a regra apontada, não significa que não possa existir entendimento diverso, pois tão importante quanto o conteúdo do espelho de ponto é o teor da prova testemunhal produzida em audiência.
Importante consignar aqui, o controle da jornada do empregado através do cartão de ponto é o constante na lei, porém, nada impede que o trabalhador tenha seu efetivo horário de trabalho controlado por outros meios, tais como: prova testemunhal, e-mails trocados em horários que não são registrados, etc.
Contudo, são excluídos da obrigatoriedade do controle de jornada e do recebimento de horas extras, os colaboradores enquadrados em cargo de confiança, trabalho externo ou regime de teletrabalho (importante frisar que regime de teletrabalho não se confunde com home-office, mas trataremos deste ponto em outro artigo).
Tal exceção não é absoluta, imprescindível a análise de cada caso, pois ainda que o funcionário esteja submetido a algum dos aludidos cargos, é possível que exista monitoramento da jornada, seja por meio de fiscalização visual do superior hierárquico, seja através de meios tecnológicos como, aplicativos WhatsApp, TeamViewer, dentre outros, com o consequente direito à remuneração das horas excedentes à jornada contratual.
Como se vê, embora pareça um assunto de fácil compreensão, ante as peculiaridades e complexidade da questão, é prudente a figura do advogado, evitando-se, de tal modo, interpretação de forma equivocada.
Sobre a autora:
Aline Alves de Araujo Ferreira: Advogada Júnior do Gelson Ferrareze Sociedade de Advogados. Advogada graduada pelo Centro Universitário Eurípedes de Marília-UNIVEM. Pós-Graduanda em Direito e Processo do Trabalho pelo Instituto Damásio de Jesus.