Nos últimos meses, tivemos mais de uma notícia tratando da possibilidade de penhora dos salários de sócios ou ex-sócios de empresas devedoras na justiça do trabalho, mas o que isso significa? Quais os tipos de bens que podem ser penhorados? Como funciona a chamada “execução definitiva” de um processo trabalhista?
A primeira fase de qualquer processo trabalhista é chamada de “fase de conhecimento”. É nela em que todas as provas são reunidas e os pedidos são colocados de frente a um juiz, para julgamento. Após essa fase, proferida a sentença, entramos na chamada “fase recursal”, em que as partes poderão levar os pontos do seu descontentamento com a decisão do juiz para novo julgamento pelo tribunal. Caso tenha qualquer dúvida sobre essas primeiras partes do processo, recomendamos que acesse nosso resumo sobre a primeira fase de um processo trabalhista: https://gfsa.com.br/resumo-sobre-a-primeira-fase-de-um-processo-trabalhista/
Digamos, então, que seu processo percorreu essa jornada, passou por todos os recursos cabíveis e, finalmente, chegou ao que chamamos de “trânsito em julgado”, quando já não cabe mais nenhuma espécie de recurso quanto aos direitos reconhecidos. Esse é o momento em que aquela condenação, que é abstrata, será convertida em valores. Utilizando como exemplo o caso em que um bancário tem o direito às 7ª e 8ª horas reconhecidas, quando do trânsito em julgado da ação, esse direito se torna definitivo. No entanto, o recebimento dos valores não é automático, pois ele depende de uma nova (e última) fase: a fase de execução.
A execução trabalhista é a fase do processo em que o Poder Judiciário determina o cumprimento daquilo que foi determinado pelas decisões proferidas no processo. No caso do nosso exemplo, então, o cumprimento do direito às 7ª e 8ª horas é, justamente, seu pagamento como horas extras, observando aquilo que foi decidido pelos julgadores nas fases de conhecimento e recursal.
Depois do trânsito em julgado, o processo trabalhista retorna para a primeira instância, para a Vara do Trabalho que proferiu a primeira sentença e que será a responsável por conduzir a fase de execução. Em seguida, o juiz determina que sejam apresentados os cálculos de liquidação da condenação, seguindo os critérios das decisões do processo.
Apresentados os cálculos por uma das partes, a outra terá um prazo de 8 dias úteis para concordar com os valores ou, se discordar, apresentar sua impugnação, fundamentando com os motivos pelos quais entende que os cálculos estavam equivocados. Em seguida, o processo voltará para o juiz decidir com base nessas petições.
Caso tenha ocorrido a impugnação dos cálculos, o juiz terá duas opções. Ele poderá decidir, desde logo, que os cálculos de uma das partes estão corretos com base nos critérios de apuração dos valores – o que ocorre, normalmente, quando os valores estão bastante próximos um do outro – ou, havendo divergência complexa, poderá determinar a realização de uma perícia contábil.
No segundo caso, o processo será enviado a um perito de confiança do juízo, contador, que elaborará seu próprio cálculo e tornará líquidos os títulos da condenação. Desse laudo pericial contábil, as partes terão oportunidade de se manifestar, concordando ou não com a conclusão do perito.
Após as manifestações das partes, o juiz proferirá sentença de liquidação, definindo qual o total da condenação a ser pago pela reclamada em favor do reclamante e fixando um prazo para pagamento, que pode ser de 48 horas (prazo previsto pela CLT) ou de 15 dias úteis (prazo previsto pela lei processual civil). A empresa poderá pagar espontaneamente, mediante guia de depósito judicial, caso em que os valores ficarão em uma conta vinculada ao processo, ou indicar bens para garantir a execução.
Efetuado o pagamento ou garantida a execução com outros bens, a reclamada terá prazo de 5 dias úteis para opor eventual recurso somente quanto aos critérios do cálculo pois, como vimos anteriormente, o direito às parcelas definidas no processo já se tornou definitivo a partir do momento do trânsito em julgado.
Essa garantia do juízo pode ocorrer de diversas maneiras: a empresa pode apresentar, por exemplo, um seguro garantia, que nada mais é do que uma apólice de seguro que visa assegurar que, caso a empresa não pague o valor da condenação ao término de todos os recursos, a seguradora pagará ao reclamante. Pode, também, indicar aplicações em instituições financeiras para penhora, bens imóveis (apartamentos, galpões industriais, prédios etc.), veículos, bens móveis, entre outros, sempre seguindo a ordem de preferência estabelecida pelo art. 835 do Código de Processo Civil.
Caso a empresa opte por parcelar os valores da condenação, a lei a autoriza a fazer isso. No entanto, nessa hipótese, a reclamada desistirá do direito de opor recursos quanto ao valor homologado pelo juiz. O parcelamento se realiza conforme o artigo 916 do Código de Processo Civil, com o pagamento de uma entrada de 30% do valor homologado e o restante dividido em seis parcelas mensais, cada qual acrescida de 1% de juros e da correção monetária aplicável.
Finalizados os eventuais recursos em fase de execução ou havendo o parcelamento da dívida, o valor depositado será liberado ao reclamante por meio de alvará judicial. Caso a execução tenha sido garantida com bens, esses bens penhorados irão a leilão, para que sejam convertidos em dinheiro.
Se, no prazo fixado pelo juiz, a empresa não depositar nem indicar nenhum bem para garantir o juízo, há diversas medidas que podem ser tomadas pelo reclamante. A primeira e mais comum é o pedido de bloqueio de valores em contas bancárias, por meio do convênio Sisbajud com o Banco Central. Caso as contas da empresa não tenham valores suficientes para arcar com a condenação, é possível solicitar a penhora de veículos pelo convênio Renajud, a busca e penhora de imóveis mediante pesquisa ARISP, penhora de bens móveis mediante avaliação de oficial de justiça, penhora sobre parte da renda de um estabelecimento comercial, entre outras medidas.
Não havendo sucesso em nenhuma delas e havendo indícios ou provas de fraude, é possível efetuar a desconsideração da personalidade jurídica do executado. Nesse caso, os sócios serão responsáveis pelo valor da execução de um processo que, originalmente, correu contra a empresa.
Desconsiderada a personalidade jurídica, será possível efetuar a mesma ordem de tentativas de bloqueios e penhoras de valores, veículos, imóveis, entre outros, em face das pessoas físicas dos sócios. E nesse sentido, recentemente, os tribunais brasileiros vêm decidindo que, se o sócio da empresa executada for empregado de outra empresa, é possível efetuar a penhora de um percentual do seu salário mensal, para arcar com a condenação do processo trabalhista, com base na nova regra estabelecida pelo artigo 833, parágrafo 2º do Código de Processo Civil.
Em qualquer hipótese, a atuação do advogado é indispensável para garantir que sejam pesquisados todos e quaisquer meios de execução dos direitos reconhecidos no seu processo, pois somente assim, com o recebimento da dívida, é que a decisão judicial se tornará efetiva e o conflito será definitivamente solucionado.
Sobre a autora:
Marina Costa Rosa Sant’ana: Advogada do Gelson Ferrareze Sociedade de Advogados. Graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade de São Paulo (USP).