As notícias recentes acerca das inconsistências contábeis das Lojas Americanas trouxeram à tona inúmeros questionamentos sobre as consequências dessa espécie de ocorrência nos contratos de trabalho das empresas. Afinal, quais são as consequências se a empregadora entra em recuperação judicial ou falência?
Primeiramente, é preciso esclarecer que o simples fato de a empresa pedir a recuperação judicial não afeta automaticamente os contratos de trabalho vigentes. Assim, é plenamente possível que a empresa esteja em recuperação judicial e seus empregados continuem trabalhando normalmente, recebendo seus salários tal qual no período anterior à recuperação.
Nesses casos, é possível a negociação coletiva com o sindicato, de forma que os contratos de trabalho sejam mantidos durante a recuperação, mediante redução salarial com ou sem redução de jornada. Ou seja: é possível que o sindicato negocie a redução dos salários vigentes mantendo a mesma jornada de trabalho; ou ainda, que negocie a redução da jornada, com o consequente pagamento proporcional às horas trabalhadas.
Tais medidas são asseguradas pelo art. 611-A da CLT, e têm como objetivo principal a manutenção do maior número possível de contratos de trabalho, tanto para evitar o impacto financeiro e social de um grande número de dispensas de uma só vez, quanto para que a empresa possa continuar exercendo sua atividade, o que é essencial para que a recuperação judicial tenha sucesso e a empresa volte a ser economicamente viável ao fim do processo.
Também é possível que o plano apresentado pela empresa para a sua recuperação preveja a manutenção dos salários anteriormente vigentes, desde que esse pagamento se demonstre possível dentro dos limites da recuperação judicial e da capacidade financeira da empresa recuperanda, bem como que isso conste do plano de recuperação e que esse plano seja aprovado.
Quanto aos contratos de trabalho extintos e dívidas de natureza trabalhista, a Lei 11.101 de 2005 prevê que o plano de recuperação judicial não poderá prever prazo superior a um ano para pagamento dos créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho vencidos até a data do pedido de recuperação.
Assim, se a empresa pediu recuperação judicial em 1º de janeiro de 2023, o plano de recuperação deverá prever o pagamento de todas as dívidas trabalhistas já existentes até essa data dentro de, no máximo, um ano. Ainda, nos termos do art. 53, §1º da Lei 11.101/2005, as dívidas de natureza trabalhista vencidas nos três meses anteriores ao pedido de recuperação judicial deverão ser pagas no prazo máximo de 30 dias, com o limite de 5 salários-mínimos por trabalhador.
Após a aprovação do plano de recuperação judicial, ocorre uma suspensão de todas as execuções contra a empresa recuperanda, pelo prazo de 180 dias – o que inclui as execuções trabalhistas. Nesse caso, se a dívida tiver se formado antes do pedido de recuperação, ela seguirá os prazos já narrados. Em contrapartida, se a dívida vier a se formar somente após o pedido de recuperação, ela será quitada dentro do plano de recuperação judicial, seguindo a ordem de prioridade estabelecida por lei, sendo que as dívidas de natureza trabalhista são prioritárias acima de qualquer outra, no limite de 150 salários-mínimos por trabalhador. Os valores que ultrapassem esse limite serão considerados créditos comuns, chamados pela lei de quirografários, e terão menor prioridade para pagamento.
No caso das Lojas Americanas, tão divulgado em tempos recentes na mídia, a empresa pediu, em 16/02/2023, a liberação de R$ 192,4 milhões para quitar imediatamente todas as dívidas já existentes com trabalhadores e pequenos fornecedores, o que será analisado dentro do processo da recuperação judicial.
Por fim, caso venha a ocorrer a falência da empresa, com encerramento da atividade empresarial, tendo em vista a extinção do estabelecimento em que o trabalhador exercia suas funções, ocorrerá a rescisão de todos os contratos de trabalho, sendo devidas todas as verbas rescisórias ao trabalhador dispensado.
Nesse sentido, o art. 449 da CLT prevê expressamente que os direitos vindos do contrato de trabalho não deixam de existir em razão da falência da empresa. Todavia, o pagamento não ocorrerá no momento da rescisão do contrato de trabalho, mas sim mediante habilitação do trabalhador no processo de falência, com o reconhecimento da prioridade da dívida, por sua natureza trabalhista. Além disso, esse pagamento estará sujeito à localização de valores ou bens da empresa que possam ser utilizados para a quitação das dívidas da falida.
Recomenda-se que o trabalhador que tenha algum questionamento sobre os impactos da recuperação judicial ou da falência no seu contrato de trabalho consulte um advogado trabalhista.
Quer saber mais? Entre em contato conosco. A equipe Gelson Ferrareze Advogados está sempre à disposição para te auxiliar!
Sobre a autora:
Caroline Gallo. Assistente Jurídico. Bacharelado em Direito pela Universidade São Judas Tadeu. Cursos especializados em “Arbitragem e Resolução de Disputas nos Contratos de Seguro” e “Prática de Departamento Pessoal para Advogados Trabalhistas” pela Escola Superior de Advocacia da OAB-SP
Sobre a autora:
Marina Costa. Advogada do Gelson Ferrareze Sociedade de Advogados. Graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade de São Paulo (USP) e em Prática Trabalhista Avançada pelo Instituto Damásio de Jesus.