Uma dúvida frequente dos trabalhadores externos diz respeito ao que acontece quando o trabalho passa do limite diário ou semanal, ou seja: o trabalhador externo, que cumpra jornada extraordinária, terá direito ao pagamento correspondente? Primeiro, precisamos esclarecer o que constitui trabalho externo.
O chamado “trabalhador externo” é aquele que exerce todas ou boa parte das suas atividades profissionais fora da empresa, como no exemplo comum do vendedor externo e do propagandista, que normalmente viajam por diversos bairros ou até municípios no curso do seu trabalho comum, além das equipes que realizam filmagens e coberturas jornalísticas de eventos, motoristas profissionais, entre vários outros.
A CLT estabelece que é obrigação da empresa manter o controle da jornada dos seus trabalhadores, o que ocorre, geralmente, por meio do tradicional cartão de ponto. Entretanto, o artigo 62, I da CLT exclui essa obrigação quanto aos empregados que exerçam atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, desde que isso seja anotado na carteira de trabalho.
Acontece que, com bastante frequência, as empresas que empregam trabalhadores externos optam por não controlar suas jornadas, apesar de não cumpridos os requisitos legais. Muitos empregadores consideram que o simples fato da jornada de trabalho ser exercida majoritariamente ou integralmente fora da empresa já autoriza a falta do controle de jornada.
Há, por exemplo, casos em que a empresa exige que o funcionário compareça na empresa no início e no final de cada dia de trabalho – por exemplo, nos casos de equipes de filmagem, para retirar e depois devolver os equipamentos utilizados nas gravações –, mas em razão da maior parte da jornada ocorrer fora da empresa, mantém a anotação de que o trabalhador é externo e, por isso, não participa do controle de jornada.
E mais: há, também, casos em que a empresa adota um ou mais meios de controle, para se certificar de que o trabalhador está cumprindo com as suas funções, mas não efetua o pagamento das horas extras porque, oficialmente, afirma que o trabalhador é externo e não está sujeito ao controle de jornada.
Ocorre que essas manobras não levam em consideração que a lei prevê que são isentos do controle somente os empregados que exerçam atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho.
Não basta afirmar que a jornada é externa para que a empresa se veja livre do pagamento das horas extras laboradas. É preciso que o empregador comprove que era impossível controlar o horário trabalhado. Nesse sentido, nossos Tribunais Regionais do Trabalho têm entendido, reiteradamente, que havendo a possibilidade de controle, o empregador deve fazê-lo, independentemente de o trabalho acontecer dentro ou fora da empresa. São inúmeros os julgados que constatam que, se havia a possibilidade de controle, são devidas as horas extras.
Se você já assistiu o nosso vídeo https://gfsa.com.br/quais-sao-os-tipos-de-controle-de-jornada-do-trabalhador-externo/, sabe que são várias as opções para que a empresa acompanhe a duração do trabalho externo.
No caso que mencionamos acima, se o trabalhador era obrigado a comparecer na empresa no início e ao final de cada dia trabalhado, evidentemente seria possível que ele participasse do cartão de ponto com os demais funcionários internos da empresa.
Além disso, há empresas que instalam dispositivos rastreadores por GPS em celulares, tablets ou carros, os quais permitem que a empresa saiba quando e para onde o trabalhador se deslocou. O mesmo pode ser dito das empresas que demandam que o trabalhador preencha um roteiro de visitas periódico (diário, semanal ou mesmo mensal), detalhando os horários de chegada e saída de cada cliente/local visitado.
Há, também, empresas que exigem a utilização, pelo funcionário, de aplicativos específicos com função de check-in e check-out para marcar exatamente quando e por quanto tempo o trabalhador esteve em cada local visitado. Atualmente, existem até mesmo aplicativos de celular que permitem que o trabalhador acesse o cartão de ponto digital da empresa sem estar no local, anotando o início e o término da jornada a partir de login e senha pelo celular, tablet ou computador. E, como último exemplo, podemos citar os casos em que o gestor acompanha o trabalhador em alguma(s) visita(s), como forma de fiscalizar o trabalho.
Em todos esses casos, assim como em outros exemplos, o que a empresa faz é beneficiar-se do controle exercido sobre o empregado, cobrando a realização da jornada integral, enquanto, ao mesmo tempo, beneficia-se da alegação de trabalho externo para não ser onerada com o pagamento de horas extras para os trabalhadores que ultrapassem o limite de trabalho diário ou semanal.
A adoção de quaisquer desses mecanismos constitui forma de controle, ainda que diversa da tradicional e, por isso, o trabalhador sujeito a eles – ou outros semelhantes – tem, sim, direito às horas extras trabalhadas e não pagas.
Você, que é trabalhador externo e não recebe horas extras, se identificou com alguma das formas de controle descritas aqui? Quer saber mais? Entre em contato conosco. A equipe Gelson Ferrareze Advogados está sempre à disposição para te auxiliar!
Sobre a autora:
Marina Sant’Ana: Advogada do Gelson Ferrareze Sociedade de Advogados. Graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade de São Paulo (USP).